DA PRESERVAÇÃO DO CONTRATADO NA COMPRA E VENDA DE IMÓVEL

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao analisar o Recurso Especial nº 1.723.690 criou um importante precedente na preservação do contrato entre as partes, prezando pela boa-fé contratual.

Com base nos princípios da boa-fé contratual e da vedação à adoção de comportamento contraditório pelas partes contratantes, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça considerou válida a cláusula penal, proposta pelos próprios compradores de um imóvel, que previa a perda total dos valores pagos em caso de inadimplência.

Relator, o ministro Villas Bôas Cueva ressaltou que, nas relações contratuais, devem-se manter a confiança e a lealdade, não podendo a parte contratante exercer um direito próprio que contraria um comportamento anterior. Segundo o ministro, os próprios compradores, de acordo com os autos, deram causa à suposta desproporcionalidade que alegam terem suportado com a cláusula penal.

Para o relator, concluir pela invalidade da cláusula penal estabelecida no termo aditivo — ou mesmo pela redução da penalidade, da forma como pretendido pelos compradores ao indicar a violação do artigo 413 do Código Civil — “implicaria ratificar a conduta da parte que não observou os preceitos da boa-fé em todas as fases do contrato, o que vai de encontro à máxima do ‘venire contra factum proprium‘”.

De acordo com o processo, o contrato tinha valor aproximado de R$ 1,6 milhão e previa o pagamento de sinal mais duas parcelas.

Após terem dificuldades para pagar as parcelas, os compradores propuseram aos vendedores a inclusão de cláusula penal por meio de um termo aditivo ao contrato, no qual reconheciam a dívida e assumiam o compromisso de quitá-la. O aditivo estabelecia que, em caso de inadimplência, os valores pagos seriam retidos pelos vendedores a título de perdas e danos.

Com o término do prazo acertado e a inadimplência dos compradores quanto à dívida residual, os vendedores comunicaram a rescisão do contrato, com o acionamento da cláusula penal.

Em primeira instância, o juiz entendeu ser nula a cláusula penal do aditivo e determinou a restituição das quantias pagas pelos compradores, descontados os valores gastos a título de intermediação do negócio, o sinal e a multa contratual.

Entretanto, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal reformou a sentença para declarar válida a cláusula de perda integral dos valores pagos. Para chegar a essa conclusão, o TJ-DF considerou primordial a existência de mensagem de SMS enviada por um dos compradores ao corretor de imóveis, sugerindo a inclusão da cláusula penal no termo aditivo.

Em recurso ao STJ, os compradores alegaram que sugeriram a inclusão da cláusula penal quando se encontravam em situação de necessidade e pretendiam assegurar o patrimônio já investido. Com a declaração de nulidade da cláusula, os compradores buscavam a redução do valor retido para um percentual entre 10% e 25%.

O ministro Villas Bôas Cueva afirmou que o Código Civil de 2002 disciplina as hipóteses em que o negócio jurídico pode ser anulado em razão de defeitos ou vícios. O artigo 156 prevê a possibilidade de configuração do estado de perigo quando alguém, por necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, assume obrigação excessivamente onerosa.

Orientação semelhante está fixada no artigo 157 (lesão) para as situações em que uma pessoa, por premente necessidade ou inexperiência, obriga-se a prestação desproporcional ao objeto de negócio.

Todavia, o relator destacou que não há nos autos descrição da existência de risco à vida ou à integridade de alguma das partes que caracterizasse o estado de perigo. Quanto à hipótese do artigo 157, o ministro lembrou ser necessária a presença simultânea do elemento objetivo — a desproporção das prestações — e do elemento subjetivo — a inexperiência ou a premente necessidade.

“No caso dos autos, por se tratar de compromisso de compra e venda celebrado de forma voluntária entre particulares que, em regra, estão em situação de paridade, é imprescindível que os elementos subjetivos da lesão sejam comprovados, não se admitindo a presunção de tais elementos. Entendimento em sentido contrário poderia incentivar a parte a assumir obrigações que sabe serem excessivas para depois pleitear a anulação do negócio jurídico”, disse o relator. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

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